Os dez impossíveis mandamentos
Quando
se fala em 10 mandamentos da lei de Deus, vêm à mente, entre outras coisas, a
figura do grande mestre Moisés.
Uma
fatia considerável e fundamental do Antigo Testamento, primeira parte da Bíblia
hebraica se refere à odisséia de Moisés e a libertação e organização do povo
hebreu[1].
É
preciso trazer à luz certos detalhes ocultos nas entrelinhas.
Ninguém
sabe o nome de Moisés. Até mesmo porque não interessa. Moisés significa “o que
foi salvo das águas”. É a descrição de um acontecimento. “Moisés” é um evento
na vida da pessoa. Toda pessoa deve aprender a nadar e a se salvar de suas próprias
águas genésicas.
O mestre histórico era hebreu, uma das sub-raças da atual
raça. Mas foi criado pelos egípcios e se tornou um de seus príncipes. Portanto
foi formado e educado na doutrina e mistérios egípcios.
Moisés, Príncipe do Egito, grande iniciado das Antigas
Escolas de Mistério do Nilo.
Segundo a tradição egípcia, quando o iniciado desencarnava,
devia prestar contas a Osiris diante do Tribunal da Justiça ou o Tribunal do
Karma.
Devia receber veredicto positivo dos 42 juízes do karma,
segundo o atributo de cada um. Portanto haviam 42 leis que deveriam ser observadas
em vida para ser aprovado no momento do juízo. São conhecidas como as 42 leis
da Justiça Divina.
Moisés aplicou essas 42 leis como regras de espiritualidade
para o povo hebreu.
Porém, como ainda era um povo muito rude, não puderam
assimilar os rigores dos mandamentos.
Moisés, por tolerância e como prova de amor ao seu povo,
quebrou as tábuas da lei. Aplicou a devida disciplina e subiu novamente o Monte
Sagrado para trazer uma versão simplificada das regras de espiritualização, os conhecidos
10 mandamentos do cristianismo.
Esse evento é simples de imaginar, aplicando-o aos tempos
modernos. As pessoas são incapazes de vivenciar os dez preceitos da
espiritualidade. São por demais rigorosos. Estas regras determinam um alto
padrão de comportamento e disciplina. Uma atitude superior e espiritualizada em
relação aos seres vivos, ante a sociedade, à comunidade e à família.
Dizer sempre a verdade é um grande desafio. Viver em função
da verdade mesmo que doa não é para pessoas comuns e correntes.
Favorecer a vida, não matar por prazer ou esporte o
vegetal, animal ou humano. Não ofender, não destruir ou atacar o ânimo ou o
entusiasmo das pessoas. Etimologicamente, ânimo vem do latim anima, que significa alma, psiquê,
intenção, vontade, vida.
Se o mundo em geral conseguisse absorver somente essas duas
leis, que tipo de humanidade habitaria este planeta?
Se você e sua família respirassem naturalmente essas duas
leis, que impacto teria na comunidade, no bairro ou sociedade?
As dez regras básicas conformam um primeiro grau de
espiritualidade. Quando o iniciado absorve os dez princípios naturais, então
percebe que há mais.
Percebe que a natureza está lançando situações diariamente
nos diversos eventos da vida. Cabe à própria pessoa se auto-lapidar e fazer as
escolhas certas, aplicar as palavras certas, tomar a atitude certa, sempre em
função da espiritualidade.
Cada atitude, ação ou palavra produz um resultado. Isso é o
karma. Ação e conseqüência.
Pode-se produzir conscientemente um karma positivo.
A fome, miséria e desgraça são karmas negativos. Foram
produzidos em algum momento.
A humildade, o trabalho, o conhecimento, o respeito e a
caridade podem anular o karma negativo da fome e miséria, promovendo outro
karma, um karma oposto, desejado, positivo, que traz alimento, desenvolvimento
e prosperidade.
As divindades egípcias são na maioria das vezes a
representação arquetípica de forças que fluem na natureza humana.
As formas de animais servem para caracterizar os princípios
que eles representam; e não que os egípcios idolatravam figuras
antropozoomórficas.
Apesar disso, alguns personagens da história do Egito foram
elevados à condição de divindades, pelo altíssimo grau de Sabedoria que
possuíam, como Thot, Osíris, Ísis, etc.
Portanto, os 42
juízes do Tribunal do Karma são princípios naturais de organização psíquica e
espiritual. São uma proteção natural para que o ego animal não invada os planos
superiores de consciência.
No livro dos mortos do Antigo Egito, encontramos a
descrição do momento em que o iniciado se apresenta diante de Osiris e declara
sua “Confissão Negativa”, contida no Papiro de NU.
“O capítulo CXXV consiste em três partes: a Introdução, a
Confissão Negativa e um texto para rematar. Dizia-se a introdução quando o
falecido chegava à Sala da Dupla Maat; a Confissão Negativa era recitada por
ele perante os quarenta e dois deuses que estavam na Sala; e o texto final
quando ele chegava ao mundo inferior.”
Descrição da lâmina:
Barbado e ostentando a coroa “branca”, de pé num santuário, cujo teto é
encimado por uma cabeça de falcão e por uraei,
o deus Osiris empunha os emblemas costumeiros de soberania e domínio. Atrás
dele está a deusa Ísis e, à sua frente, sobre uma flor de loto, os quatro
filhos de Horus, Questa, Hapi, Tuamutef e Quebsenuf.
Descrição da lâmina:
o falecido e sua esposa[2]
aparecem em pé, com as mãos erguidas em sinal de adoração.
“Texto: o
seguinte será dito quando o intendente da cada do intendente do selo, NU,
triunfante, aparecer na sala da Dupla Maat, de modo que seja alijado de todo e
qualquer pecado que tenha cometido e contemple o rosto dos deuses. O Osíris NU,
triunfante, diz: “
“Homenagem a ti, ó Grande Deus, Senhor da dupla Maat, vim
ver-te ó meu Senhor, e cheguei até aqui para contemplar tua beleza. Conheço-te,
conheço o teu nome, e conheço os nomes dos quarenta e dois deuses que estão
contigo na Sala da dupla Maat, que vivem como carcereiros de pecadores e se
alimentam do sangue destes últimos no dia em que a vida dos homens são tomadas
em consideração na presença do deus Un-nefer; na verdade
‘Recti-merti-neb-Maati’ (irmãs gêmeas com dois olhos, senhoras da dupla Maat) é
o teu nome. Na verdade vim a ti e trouxe-te Maat (justiça e verdade), e destruí
a maldade para ti. Não fiz mal à humanidade. Não oprimi os membros da minha
família, não pratiquei o mal em lugar da justiça e da verdade. Não tenho
conhecido homens sem valor. Não tenho praticado o mal. Não tenho feito que a primeira
consideração de cada dia seja a de mandar realizar para mim um trabalho
excessivo. Não apresentei meu nome para exaltação de honrarias. Não maltratei
criados. Não desprezei a Deus. Não
fraudei o oprimido de sua propriedade[3].
Não fiz o que os deuses abominam. Não fui causa de que o chefe prejudicasse os
servo. Não causei dor. Não fiz nenhum homem sofrer fome. Não fiz ninguém
chorar. Não pratiquei homicídio. Não dei ordem para que nenhum homicídio fosse
praticado em meu proveito. Não infligi sofrimento ao gênero humano. Não fraudei
os templos das suas oblações. Não roubei os bolos dos deuses. Não furtei os
bolos oferecidos às almas imortais. Não forniquei. Não me polui nos lugares
sagrados do deus da minha cidade, nem subtraí coisa alguma do alqueire. Não acrescentei
nem roubei com fraude terra nenhuma. Não me apossei dos campos de outrem. Não
mexi nos pesos da balança para enganar o vendedor. Não li errado o que indicava
a balança para enganar o comprador. Não tirei o leite da boca das crianças. Não
levei o gado que estava em seus pastos. Não peguei no laço os pássaros de penas
das coutadas dos deuses. Não peguei peixe com isca de feita de peixe da sua
espécie. Não represei água no tempo em
que ela devia correr. Não sangrei nenhum canal de água corrente. Não apaguei o
fogo (ou luz) que devesse arder. Não infringi os tempos[4]
de oferecer as oblatas seletas de comida. Não espantei o gado da propriedade
dos deuses. Não repeli Deus em suas manifestações. Sou puro. Sou puro. Sou
puro. Minha pureza é a pureza do grande Benu
que está na cidade de Suten-henen (Heracleópolis), pois eis que sou o nariz do
Deus dos ventos, que faz toda a humanidade viver no dia em que o Olho de Rá
está cheio em Anu (Heliópolis) no fim do segundo mês da estação Pert (isto é, a
estação de crescer) na presença do divino senhor da terra. Vi o Olho de Rá
quando estava cheio em Anu e, portanto, não me aconteça nenhum mal nesta terra
e na Sala da dupla Maat, pois sei os nomes dos deuses que ali estão e que são
os seguidores do grande deus”.
A Confissão Negativa
Descrição da lâmina:
A Sala da dupla Maat, o que quer dizer, a Sala das deusas Ísis e Néftis, que
simbolizam a Justiça e a Verdade; neste lugar estão sentados, ou em pé,
quarenta e dois deuses, a cada um dos quais o falecido precisa dirigir uma
declaração negativa determinada. Em cada extremidade vê-se a metade de uma
porta de dois batentes, uma chamada NEB-MAAT-HERITEP-RETUI-F e a outra,
NEB-PEHTI-QUESU-MENENET. No centro do teto, que exibe uma cornija de uraei, típicos da divindade, e penas,
símbolo de MAAT, está sentado um nume, pintado de verde azulado, com as mãos
estendidas, a direita sobre o Olho de Horus, e a esquerda sobre uma lagoa. Na
extremidade da Sala vêem-se quatro vinhetazinhas, em que estão pintadas:
1.
As deusas Maat, sentadas em seus tronos, empunham um cetro com a mão direita e
o emblema da vida com a mão esquerda.
2.
O falecido, vestido de branco, em pé diante de Osíris, ergue as mãos em sinal
de adoração.
3. Uma
balança que tem o coração, símbolo da consciência do falecido, num dos pratos,
e a pena, emblema da Justiça e da Verdade, no outro. O deus Anúbis testa o fiel
da balança, e perto dele está o monstro Am-met[5].
4. Thot, com cabela de Íbis, sentado em um
pedestal em forma de pilono, pinta uma grande pena de Maat. No papiro de Anhai
os deuses estão sentados em fila dupla; cada qual ostenta a cabeça que o
caracteriza, e quase todos usam a pena de Maat.
Texto: o escriba
Nebseni, triunfante, diz:
1 – “Salve, ó tu, espírito que marchas a grandes passadas e
que surges em Anu (Heliópolis), escuta-me! Eu não cometi iniqüidade.
2 – Salve, ó tu, espírito que te manifestas em Ker-ahá e
cujos braços estão rodeados de um fogo que arde! Eu não roubei com violência.
3 – Salve, ó tu, divino Nariz (Fenti), que vens de Quemenu
(Hermópolis), não fiz violência a homem
algum.
4 – Salve, ó tu, que comes sombras, que vens do sítio onde
o Nilo aparece, não roubei.
5 – Salve, Neha-hau, que vens de Re-stau, não matei homem
nem mulher.
6 – Salve, ó tu, duplo deus-Leão, que vens do céu, não aligeirei
o alqueire.
7 – Salve, ó tu, cujos olhos são como pederneiras, que vens
de Sequem (Letópolis), não agi com fraude.
8 - Salve, ó tu, Chama, que vens como vais, não furtei as
coisas que pertencem a Deus.
9 - Salve, ó tu, Esmagador de Ossos, que vens de Suten-henen (Heracleópolis), não proferi falsidades.
10 - Salve, ó tu, que fazes forte a chama para a cera, que
vens de Hetca-Pta (Mênfis), não
furtei comida.
11 - Salve, Querti (isto é, os dois manaciais do Nilo), que
vindes de Amentet (Amenti), não
proferi palavras más.
12 - Salve, ó tu, cujos dentes brilham como o sol, que vens
de Ta-she (isto é, Faium), não
ataquei homem algum.
13 - Salve, ó tu, que consomes sangue, que vens da casa do
abate, eu não matei os animais do templo.
14 - Salve, ó tu, que consomes as entranhas de pecadores,
que vem da câmara mabet, não
defraudei.
15 - Salve, ó tu, deus da Justiça e da Verdade, que vens da
cidade da dupla Maat, não saqueei as terras aradas.
16 - Salve, ó tu, que andas para trás, que vens da cidade
de Bast (Bubastis) , nunca me
intrometi em assuntos alheios para criar discórdia.
17 - Salve, Aati, ó tu, que vens de Anu (Heliópolis), não pus minha boca em
movimento contra nenhum homem.
18 - Salve, ó tu, que és duplamente mau (espírito Tatuf), que vens do nomo de Ati,
não dei vazão à cólera em relação a mim sem causa.
19 - Salve, ó tu, serpente Uamenti, que vens da casa da
matança, não conspurquei a mulher de homem algum.
20 - Salve, ó tu, que velas sobre o que é trazido para ele,
que vens do Templo de Ansu, não pequei contra a pureza.
21 - Salve, chefe dos divinos Príncipes, que vens da cidade
de Nehatu, não despertei medo em ninguém.
22 - Salve, Quemi (isto
é, Destruidor), que vens do Lago de Caui, não violei tempos e estações
sagradas.
23 - Salve, ó tu, que ordenaste a fala, que vens de Urit, não
me entreguei à cólera.
24 - Salve, ó tu, Criança, que vens do Lago de Hec-at, não
me fiz de surdo às palavras da Justiça e da verdade.
25 - Salve, ó tu, que dispões da fala, que vens da cidade
de Unes, não provoquei lutas.
26 - Salve, Basti, que vens da cidade Secreta (que apareces nos Mistérios), não fiz
nenhum homem chorar.
27 - Salve, ó tu, Her-Fy-MHa-Tep-Fy-Ert-Fy-Dbw-Tep-F (cujo rosto está voltado para trás), que
vens da Residência, não cometi atos de impureza, nem me deitei com homens.
28 - Salve, Perna de Fogo, que vens de Akhekhu, não comi
meu coração (isto é, “eu não destruí meu
coração” ou “não perdi a calma e me zanguei”).
29 - Salve, Quenemti, que vens da cidade de Kenemet, não
maltratei homem algum (ou não amaldiçoei ninguém).
30 - Salve, ó tu, que trazes tua oferenda, que vens da
cidade de Sau (Saís), não agi com
violência.
31 - Salve, ó tu, Nebt-Heri (isto é, senhor dos rostos ou aquele cujas faces são múltiplas), que vens da cidade de Tchefet , não agi
precipitadamente.
32 - Salve, ó tu, que dás conhecimentos, que vens de Unth, não
faltei com o respeito aos deuses.
33 - Salve, ó tu, senhor dos dois chifres, que vens de
Santiú, não multipliquei minha fala em demasia.
34 - Salve, ó tu, Nefer-Tem, que vens de Hetca-Ptá (Mênfis), não agi com fraude, nem obrei
com perversidade.
35 - Salve, ó tu, Tem-Sep, que vens de Tetu (Djedu), não amaldiçoei o rei.
36 - Salve, ó tu, cujo coração trabalha, que vens da cidade
de Debti, eu jamais poluí as águas.
37 - Salve, Ahi da água, que vens de Nu, não tornei soberba
a minha voz.
38 - Salve, ó tu, Hed-Rexty, que dás ordens à humanidade (que ordenas aos iniciados), que vens de
Zsat (Sau), eu não maldisse o deus.
39 - Salve, Neheb-Nefert, que vens do Lago de Nefer, não
procedi com insolência.
40 - Salve, Nehebe-Kau, que vens da tua cidade (caverna), não tenho buscado distinções (ou “não
agi com desdém”).
41 - Salve, ó tu, Tseru-Tep (isto é, cuja cabeça é sagrada), que vens da tua habitação (santuário), não aumentei minha riqueza,
a não ser com as coisas que são justamente minhas.
42 - Salve, ó tu Ena-F (que
trazes teu próprio braço), que vens de Auquert (mundo inferior), não desprezei o deus que está em minha cidade.
Bibliografia:
- BUDGE, Sir E. A. WALLIS, O livro egípcio dos mortos. 13ª
edição. Pensamento-Cultrix. 2010. 567 pp.
- SELEEM, RAMSES, O livro dos mortos do antigo Egito.
Tradução: Ligia Capobianco. 2ª edição. São Paulo. Madras. 2005. 175 pp.
- Bíblia de Jerusalém, Nova edição revista e ampliada. São
Paulo. Paulus. 20/08/2002.
[1] Povo
que habitou o Monte Hebron.
[2] A
Ísis particular, representação física da Mãe Divina.
[3]
Variante, “não causei sofrimento, não causei aflição.”
[4]
Variante: “não fraudei os deuses das suas oblatas seletas de comida”.
[5] O
demônio com cara de crocodilo. Representa o tempo, o renascimento como pessoa
humana, retorno ao vale do samsara. Se o iniciado não for aprovado no
julgamento, será devorado por Am-met, isto é, deverá renascer.